Lógica, a expressão falsas equivalências talvez possua autoria reconhecida. Talvez seja dessas de senso comum — ainda que nem tão comum. Comum, sim, tornou-se a ocorrência daquilo que expressa.
Tanto assim tem sido, que falsas equivalências foi expressão mencionada por sólido par de articulistas — aparentemente distantes entre si — nas últimas semanas. Diz-se “aparentemente” porque a distância, ao que parece, é algo que virtualmente acabou.
Oxalá apenas virtualmente, pois ainda é preciso se deslocar daqui ali caso o braço não alcance, caso não haja empregado a assumir tal esforço, caso falhe o onipresente delivery, sempre tão ao alcance da mão — quase já a própria mão.
Mesmo que propaguem muitos o contrário, essa também uma falsa equivalência.
Dos Estados Unidos, o crítico de música (e cultura) Bob Lefsetz se refere a falsas equivalências em pelo menos três dos recentes comentários que dedicou ao caso envolvendo Neil Young, Spotify e Joe Rogan.
Sem meias palavras, escreve Lefsetz:
Sim, depois de demasiada quantidade de gente encher a boca para falar em ciência, como se autoridades na área fossem (ainda que autoridades governamentais sejam), e evocando a ciência como se à religião equivalesse — é inevitável certo enfado quando vem outra vez alguém falar em nome e em defesa da ciência.
Porque a ciência, se verdadeira ciência for, não precisa de nada disso, muito menos de falsas autoridades científicas a falar como se a tal equivalentes fossem.
Não é esse, por supuesto, o caso do Bob; dê-se-lhe então uma terceira dose de paciência, irritado que está com os antivacina, etc. Mesmo que na maioria das vezes haja um outro lado em qualquer história, ou mais de um, isso não quer dizer que haja necessária equivalência entre eles. E menos ainda entre diferentes opiniões.
À direita e à esquerda, ao centro, vá alguém dizer isso em voz alta na terra brasilis de hoje.
Não obstante, em manifestação de razoabilidade advinda também do que por aqui se deu — Flow Podcast, Jovem Pan — logo depois de Joe Rogan, Spotify e Neil Young ocuparem manchetes mundo afora, tais alvissareiras reações demonstraram haver ainda limites para a falsa equivalência de opiniões não equivalentes.
(A propósito, outra falsa equivalência, desta vez por parte do NY Times, ao equivaler o podcaster brasileiro ao podcaster americano. Equivalência equivocada mesmo dentre as simplificações feitas por correspondentes e editores internacionais.)
Do Brasil, o ombudsman da Folha, José Henrique Mariante, parte precisamente da reação de leitores à cobertura do havido no Flow Podcast para alertar que cabe ao jornal “tomar cuidado com o peso que dá para as coisas e com falsas equivalências.”
Em suma, uma confusão entre liberdade e responsabilidade aparenta atualmente existir.
Como ressalta Mariante:
De falsa equivalência em falsa equivalência, era intensa a impressão de que nos encaminhávamos para a relativização de tudo — erro que poderia equivaler a um caminho sem volta.
Por outro lado, ainda que paulatinamente, parece que vamos coletivamente redescobrindo que uma irrestrita liberdade particular não é equivalente à genuína liberdade geral — e felizmente, pois poucas coisas se equivalem à abjeção e ao terror que de tal destino poderiam retornar ou emergir.
Algo de bastidor
Tem sido um falseio perigoso, de todo modo, o flerte com tantas e variadas falsas equivalências.
L.O.V. Leia Ouça Veja
“Monark deve ir para a cadeia?” (Carlos Graieb, O Antagonista).
“Brazil’s Joe Rogan Faces His Own Firestorm Over Free Speech” (NY Times).
“Monark comete o equívoco do jovem liberal em seu podcast 'Flow'” (Luiz Felipe Pondé, Folha).
“YouTube proíbe Monark de criar novo canal após falas sobre nazismo” (TecMundo).
Playlist Condizente 07 22
Subirusdoistiozin — Criolo
“Acostumado com sucrilhos no prato.”
Glory Box — Portishead
“We’re all looking at a different picture.”
Just Be a Woman — Lenny Kravitz
“The answers are within your own mind.”
Throw It Back — BRELAND, Keith Urban
“You can blame it on the Jack.”
Na série “Sonoras que Condensam a Vida”
“O papel do jornal é elevar o debate, ainda que o país insista em voltar à quinta série.”
José Henrique Mariante, ombudsman da Folha; fevereiro, por aí
Last but not least
O chato do Português
“Entre outras mil és tu Brasil ó pátria amada.”
Rosângela Wolff Moro; meados de fevereiro, por aí