Base de sustentação coletiva, o que nos resta de reserva moral? Uma pessoa ou instituição, uma lembrança ou perspectiva. Firmeza com que se pode contar, solidez a que se pode recorrer. Uma ideia de país.
Nosso país. Nada de boas ações de almanaque envelhecido. Mesmo porque uma oscilação ou outra em nossa conduta, pública e conjunta, isso faz parte: ainda que não devesse acontecer, acontece.
Eventual flerte com o indevido talvez até lastreado, se não por incerta e ingênua crença na moralidade do todo, pela confiança de que alguma estabilidade ética conduz as principais práticas da nação.
Bem, o descansado diria que uma estabilidade antiética é igualmente uma estabilidade. Sim, mas ainda que as regras possam existir para serem quebradas, não há regra no descumprimento da regra.
Ora, o desregrado pode até mesmo cumprir as regras. Se as segue ou não, particularmente, sabe que deverá lidar, geralmente, com as consequências da própria conduta. Sabe? Sabe que talvez não.
Há hoje cotidianas e contínuas quebras de regra em nome da manutenção da regra. Dizem que a coisa toda ainda funciona. Esse regrado desregramento, contudo, parece abalar a confiança no todo da regra. Há quem queira mais.
Seria um amoral eximir de responsabilidades atribuir tudo isso à internet e às redes sociais. E se as barbaridades cognitivas a circular por aí forem menos causa e mais consequência de prévios desregramentos outros?
Claro, um meio de comunicação assim possante é certamente catapulta de qualquer coisa — como bem tem sido. Por que então os malefícios, que não são poucos, parecem se sobressair aos benefícios, que são muitos?
Uma hipótese talvez resida num desintegrador atender de particularidades. Não pelo particular em si, mas por subjazer a tal atenção um viés redutor do geral — como que em oposição a um diferenciado adendo agregador.
Mais verdadeiramente múltipla seria a generalidade se a reunião de particulares não requeresse, como parece requerer, com e sem internet, o desregramento do que naturalmente regrado era ou estava.
Afinal, se integrado, o todo tende a ser maior que a soma das partes. Do particular para o geral, nova regra de conduta que tarda a ser abandonada é a generalizada redução do respeito ao outro (particular ou geral).
Coisa de almanaque? Que seja, e essa não envelhece. Sem regra, não há jogo. Palavras tornam-se vazias, ações tornam-se inconsequentes. Até o limite em que a regra maior, da sempre geral realidade, volta a se impor.
Não sem efeitos. Os indícios estão aí, não são poucos e não são desconhecidos. Educação, cultura… Pois é. Sinônimos desaparecidos, sentido perdido das palavras. Ações abandonadas, verbos caídos em desuso.
Qual a origem do desconforto? Ainda que não a mesma para todos, esse se mostra, sim, como sentimento generalizado. Como podem ser as possíveis consequências de tal desajuste, para todos delicadas e prejudiciais.
Na falta de reserva moral, sente-se a ausência de pessoa ou instituição apta a restabelecer algum consenso — pessoa ou instituição não apenas assim intitulada, mas assim pela maioria reconhecida.
Enquanto alguns flertam com a mudança de regra do lado de fora, outros o fazem pelo lado de dentro. Ambas posições já ocupadas por ambos os lados. Será por isso que surge um terceiro lado no círculo da nação?
Sem nuances, apontamos a farsa do outro lado da rua. Identificamos o burlesco em perfis nos quais não nos reconhecemos, mas em que nos espelhamos. Desfazemos de lá imaginando que enaltecemos cá.
Avançado flerte com a irracionalidade ou pleno exercício de razoabilidade, nosso sistema parece abrir mão de lembranças e perspectivas, como se delas prescindisse. A república, porém, é uma só. Mesmo que não em essência.
De parte a parte, o prazer particular com o insucesso alheio pode redundar em generalizado e amargo fracasso do conjunto. De qual esfera será maior a composição de forças, simbólicas e constitucionais — ou já nem mais.
Algo de bastidor
Na anunciada e falseada Black Friday sem descontos do atacadão veterinário, o gentil atendente informa a razão da não disponibilidade do antiparasitário habitual: “Está faltando obra-prima.” À falta de uma, ofereceu outra.
L.O.V. Leia Ouça Veja
“O Manual do Comentarista Moderno de Futebol. Como o nível dos comentaristas chegou ao fundo do poço, qualquer um pode aspirar essa carreira, ganhar uma boa grana, viajar o mundo e curtir futebol” (Veja).
“Quem é o antiTite de Tite na seleção? Treinador precisa de um colega para lhe apontar caminhos ou fazê-lo enxergar o óbvio” (Robson Morelli, Estadão).
“‘Como alguém pode comprar um sofá pela internet?’” (Valor).
“Por que os bolsos de roupas femininas são tão inúteis?” (Pilita Clark, Financial Times/Valor).
“Frota desiste de integrar transição e culpa ‘esquerda sapatênis’” (Poder360).
“Barroso, sobre resultado das eleições: ‘Não adianta apelar a quartéis e extraterrestres’” (O Antagonista).
“Para que não tenham sucesso é preciso que as instituições saiam, com urgência, do modo ‘funcionando normalmente’” (Cristina Serra, Folha).
“Os extremistas que sonham com o cassetete da ditadura precisam conhecer o cassetete da democracia” (Demétrio Magnoli, Folha).
“A régua é a lei, e não a vontade de quem tem o cassetete ou a caneta” (Estadão).
“A questão que se impõe de forma inequívoca, contudo, é como chegamos a esse ponto teológico-político após quatro anos de Bolsonaro no poder” (Joel Birman, Folha).
“Não é razoável insultar ministros na rua, como aconteceu em Nova York. Mas também não é razoável que ministros viajem financiados por empresa para falar de democracia em Nova York. … Em 2018, o STF era acusado de impedir a candidatura de Lula. Foi preciso uma nova eleição para superar o problema. Agora o STF é acusado de reconduzir Lula” (Fernando Gabeira, O Globo).
“Lula se mostra cada vez mais refém dos acontecimentos. … O silêncio de Lula da Silva mostra a incompreensão do desafio de construir uma coalizão de governo para uma nova concertacíon que não seja mera desculpa para a divisão de cargos” (Marcelo Godoy, Estadão).
“Economistas lançam carta a Lula e dizem que defesa do teto para garantir disciplina fiscal é uma ‘falácia’” (CartaCapital).
“Lula está no meio do caminho entre criar consensos ou provocar perigosa crise de confiança” (William Waack, Estadão).
“O ponto é que há uma ferida aberta na democracia brasileira, e quem não emigrar para Portugal ou para o Canadá, e tem alguma responsabilidade com o país, deveria se preocupar com isso” (Fernando Schüler, Veja).
“Comandantes das Forças Armadas planejam dar posse aos indicados por Lula já em dezembro” (Marcelo Godoy, Estadão).
“E por que o ainda presidente Jair Bolsonaro assinaria os atos de nomeação? Para ser bonzinho com Lula? A ideia não cheira bem” (Eliane Cantanhêde, Estadão).
“TSE sob Moraes suspende perfis sem definição de limites e critérios na lei” (Folha).
“É cada vez mais difícil, hoje, o ministro Alexandre de Moraes aparecer no noticiário sem que esteja provocando algum tumulto … . Seu último surto é a ‘convocação’ de todos os comandantes das PMs estaduais para o seu gabinete em Brasília” (J.R. Guzzo, Estadão).
“Moraes convoca reunião com PMs no TSE” (Estadão).
“Dino reúne comandantes e diz que relação com PM melhorou” (Poder360).
“YouTube suspende a monetização de todos os canais da Jovem Pan” (CartaCapital).
“Bolsonaro interrompe reclusão para endossar ação do PL contra urnas” (Folha).
“O PL afirmou haver irregularidades nos equipamentos e que, se excluídos, o atual chefe do Executivo venceria a disputa ao Planalto em 2022 por 51,05%” (Poder360).
“Valdemar Costa Neto procura STF e faz jogo duplo com relatório sobre urnas” (Malu Gaspar, O Globo).
“‘Se houve um alegado defeito que coloca em xeque a votação no 2º turno, evidentemente esse defeito teve no 1º turno. Ia ter que anular toda a eleição de senadores, deputados, governador’, disse Lewandowski, que é vice-presidente do TSE” (Poder360).
“É possível identificar a urna por outros meios. Dentro do próprio log de urna há uma outra identificação chamada Código de Identificação da Carga” (Júlio Corrêa, O Antagonista).
“Ausência de número de série não impossibilita identificação de urnas, diferentemente do que diz PL” (Estadão).
“A resposta-relâmpago de Moraes ao questionamento de Bolsonaro às urnas. O presidente do TSE publicou um despacho 13 minutos após receber a representação do PL” (Veja).
“Moraes dá 24 horas para o PL apresentar auditoria das urnas do 1º turno” (CartaCapital).
“Mourão critica TSE após decisão sobre relatório do PL: ‘Ações contundentes e exacerbadas’” (O Antagonista).
“Presidente do TSE usou o tom adequado à tentativa do PL de questionar o resultado das eleições. Palavras fortes, porque o que Valdemar Costa Neto fez é crime, e como crime deve ser tratado” (Míriam Leitão, O Globo).
“Se é verdade que o golpismo precisa ser enfrentado, isso não pode servir de pretexto para que a própria Justiça cometa arbítrios por não dispor de instrumentos legais suficientes” (O Globo).
“Senador [Eduardo Girão] diz a Lewandowski que STF participa de ‘caos’ e ‘censura’” (Poder360).
“Direitos não se concretizam sem habitação para todos, diz Moraes. Ministro do STF comanda audiência pública sobre condições da população em situação de rua no país” (Poder360).
Do (retuíte keine endorsement, mas pode ser)
“Carrascosa, o argentino que não quis ser campeão do Mundo. A sua oposição ao regime militar levou-o a renunciar silenciosamente à seleção albiceleste.” — Miguel L. Pereira,
Playlist Condizente 2247 — The Obra-Prima Mix
Mais Um na Multidão — Erasmo Carlos, Marisa Monte
“Deixo o óbvio.”
Do Fundo do Meu Coração — Erasmo Carlos, Adriana Calcanhotto
“Cada vez que vi.”
Cavalgada — Erasmo Carlos, Maria Bethânia
“Por uma estrada colorida.”
Além do Horizonte — Erasmo Carlos, Tim Maia
“Sem saber a hora.”
Na série “Sonoras que Condensam a Vida”
“Nós transformamos tudo em um computador — desde as infraestruturas críticas dos hospitais até as administrações públicas, universidades, empresas, nossos corpos, nossas roupas, nossos eletrodomésticos e a eletricidade. Por isso, se a internet caísse, tudo deixaria de funcionar e seria produzido um efeito em cascata, um efeito dominó, porque afetaria até mesmo os serviços que não estão conectados à rede.”
Esther Paniagua, jornalista; final de novembro, por aí
O Artilheiro Musical
Não pede música, faz
“Mas aquele 1% é vagabundo.”
Marcos & Belutti; Aquele 1%
Last but not least
O chato do Português
“Na minha carreira anterior, eu recebia a cada 2 dias o que eu recebo hoje por mês como Senador. E ainda tendo que ouvir ataques, ofensas e ingratidão.”
Marcos do Val, senador; final de novembro, por aí